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“Ajudava muito na cicatrização das feridas”
Experiências com a pomada da folha da graviola

Frazão no laboratório

Frazão, realizando suas experiências com a folha da graviola em seu laboratório na Infraero.

Formado em Química pela UFMA de São Luís e com experiência nas áreas de Biofísica, Farmacologia e Fitoterapia, Frazão dedicou-se ao estudo das plantas medicinais e ao ensino. Em 2020, tentou, sem sucesso, uma vaga na Câmara de Vereadores de Imperatriz, mas sua trajetória sempre esteve mais ligada à ciência e à educação do que à política. Seu impacto na cidade e na fitoterapia permanece, sobretudo a sua pesquisa sobre os efeitos cicatrizantes da folha de graviola, preparada como pomada, em fórmula desenvolvida por ele, o que continua  refletido no carinho de alunos, amigos e da comunidade.

“Frazão era uma dessas pessoas boas, exalava bondade no semblante. Seu trabalho em prol da comunidade foi reconhecido pela Câmara Municipal de Imperatriz, com o título de cidadania recebido em  2008, mesmo ano em que foi premiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (Fapema)”, detalhou o jornalista e pesquisador Edmilson Sanches, em texto publicado como necrológio, logo após a morte do professor Frazão, em 2021.

No mesmo texto, Edmilson Sanches detalha todo o currículo do pesquisador. Além de químico toxicologista, graduado pela UFMA, Frazão era especialista em Fitoquímica, Fitocosmetologia e Saúde Pública, mestre em Geoquímica pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e tinha mestrado e doutorado em Química Natural. Edmilson Sanches também informa que, com um trabalho intitulado “Método alternativo de combate à anemia utilizando o açaí”, de 2008, Frazão obteve o título de professor livre-docente na Universidade Nacional da Ucrânia.

A grande marca de Frazão no campo da pesquisa se deu a partir do seu ingresso na antiga Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), campus de Imperatriz, onde atuou como  professor do Centro de Ciências Exatas, Naturais e Tecnológicas e, segundo detalha Edmilson, ministrava aulas de Geologia, Metodologia do Ensino de Ciências, Química, Química Toxicológica e Biofísica, além de Prática: Dimensão Político-Social.

“Com razoável domínio de outros três idiomas (inglês, espanhol e francês), deixou a marca de seus conhecimentos em diversos países, entre os quais África do Sul, Argentina, Aruba, Bolívia, Cuba, República Dominicana e Venezuela”, esmiuçou Edmilson Sanches. Frazão também era membro da Academia Latino-Americana de Pesquisadores em Fitoquímicos, onde ocupava a Cadeira nº 17.

Frazão fazendo atendimento.

Professor Frazão recebe paciente com receita médica.

Edmilson Sanches ressalta, ainda, que, em 2014, “junto com os pesquisadores imperatrizenses Nilson Barbosa e Cleriston de Moraes Leal, Augusto Frazão desenvolveu uma nova forma de produzir hidrogênio, a partir da água e sem consumo de energia elétrica”. Para cuidar dessa tecnologia, conforme explicou o pesquisador em seu texto, os três criaram no Maranhão uma empresa, a Hidrogás. “Frazão também foi sócio de outras empresas da área, a Cipak Indústria Química e Farmacêutica, no estado do Tocantins. Ambas as empresas estão inativas há anos”, registrou.

Por fim, Edmilson Sanches comentou, em detalhes, no texto do necrológio, a história da candidatura à vereador. “Torci por ele em 2020, quando colocou seu nome para disputar uma das vagas na Câmara de Vereadores de Imperatriz. Mas palavras como inteligência, conhecimento, vontade, seriedade, nenhuma delas rima com “política”... Teve exatos duzentos e cinco votos. Decididamente, não foi o Frazão quem perdeu...”, relatou o jornalista.

Ana Paula Frazão, filha do professor, destaca o lado espiritual do pai, que era espírita e atuante no Centro Espírita José Grosso, localizado no bairro Bacuri. "Ele tinha mediunidade ativa e fazia um trabalho humanitário. Nunca cobrou por suas pomadas, pois era parte de sua missão espiritual", explica. Ela se refere ao estudo desenvolvido pelo pai, que o tornou notório em Imperatriz, sobre as propriedades curativas da pomada de graviola que desenvolvia. Segundo Ana Paula, a família já recebeu duas mensagens psicografadas atribuídas ao professor Frazão, mas preferem manter esse conteúdo reservado "Isso pertence somente a nós".

Ao contrário do que algumas pessoas relataram, Frazão não realizava consultas em casa. "Ele apenas entregava as pomadas para quem precisava, muitas vezes indicadas até por médicos. Quando perguntavam sobre tratamentos, ele sempre dizia: 'Consulte seu médico, mas pode tomar um chá disso ou daquilo'", conta Ana Paula.

Frazão

Frazão, com olhos sempre atentos à natureza que inspiraram sua trajetória na fitoterapia.

Frazão acompanhou de perto muitos casos de pessoas com escaras e diabetes que evitaram a amputação de membros graças às pomadas de graviola e outras plantas que ele desenvolvia. "Ele era apaixonado pelo processo de cicatrização", diz sua filha.

Antônio Expedito Ferreira Barroso de Carvalho, professor e biólogo com uma trajetória respeitada na Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão (Uemasul), compartilhou com exclusividade sua história pessoal e profissional, além de relembrar sua marcante relação com o mestre.

Villa João XXIII

Villa João XXIII, local onde Frazão levava as pomadas de graviola.

Em 1983, Expedito, ainda estudante do terceiro ano científico no Colégio Meng, em São Luís, foi aluno do professor Frazão. Naquela época, Frazão já se destacava como um educador carismático, que deixou uma marca importante na vida de Expedito. "Eu tinha 16 anos, e o Frazão já era aquele professor engraçado, que sabia como cativar os alunos. Lembro dele como alguém que realmente se preocupava com o aprendizado e o bem-estar dos estudantes", relata Expedito.

O destino, no entanto, os reuniu novamente em Imperatriz, cidade onde Expedito se estabeleceu após se formar em Ciências Biológicas pela UFMA, em São Luís. "Em 1993, cheguei a Imperatriz e, por coincidência, encontrei Frazão novamente, já como professor da rede de ensino e, depois, da UEMA. Conversamos, relembramos os velhos tempos e começamos a caminhar juntos em nossas carreiras acadêmicas".

Expedito relata que Frazão era um grande entusiasta da etnobotânica, e seu trabalho com a graviola foi um exemplo disso. “Ele desenvolveu uma pomada cicatrizante a partir das folhas da graviola, e sua eficácia no tratamento de feridas e úlceras foi amplamente reconhecida, especialmente por diabéticos, que frequentemente buscavam por esse remédio natural", contou.

O envolvimento de Frazão com as plantas medicinais também o aproximou da professora Terezinha Arrego, uma farmacêutica de renome. "Terezinha foi uma pioneira na botânica e nas pesquisas sobre plantas medicinais no Maranhão. Frazão, sem dúvida, se inspirou muito no trabalho dela. Eles compartilhavam o interesse por saberes tradicionais e pela medicina popular", explicou Expedito.

Em seu texto, Edmilson Sanches confirma que Frazão foi colaborador do programa nacional Farmácia Viva, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “Estudou remédios para diabetes, gripe, hanseníase, hipertensão, pneumonia e tuberculose”. O jornalista também detalhou outros trabalhos científicos: “Pesquisando, escrevendo ou sendo orientador de estudantes, o professor Frazão tem seu nome em trabalhos como ‘Utilização da tintura hidroalcoólica da casca da laranja-da-terra (Citrus aurantium L.) na redução da hipertensão’; e também ‘Análise dos princípios ativos da cecropia pachystachya [embaúba] no desenvolvimento de uma tintura de combate à hipertensão’; e ainda ‘Caracterização fitoquímica do cabelo do milho (Zea mays l.): uma alternativa ao combate minimizador da celulite’ e outros”.

Ronaldo Neri Farias, professor aposentado da UEMA e engenheiro civil, compartilhou sua experiência com o falecido professor Frazão, com quem dividiu muitas histórias acadêmicas e pessoais. Ronaldo relembra a contribuição significativa de Frazão para o ensino e a ciência, especialmente em áreas como fitoterapia e medicina popular.

Professor Ronaldo conheceu Frazão quando este pleiteava uma vaga como docente na Universidade Estadual do Maranhão. "Eu já estava na UEMA e fazia parte da direção do curso de Ciências. Frazão, vindo da área da Biologia, fez um seletivo para trabalhar conosco", afirmou Ronaldo.

Ronaldo confirmou que Frazão desenvolveu uma pomada cicatrizante à base de folhas de graviola e fazia doações desse medicamento experimental para várias instituições, como a Casa de Saúde João XXIII, um leprosário que ajudava na cura dos internados.

Frazão não se limitava a doar o produto a pacientes de Imperatriz. Ele levava a pomada para outras cidades maranhenses, como Grajaú, e distribuía para quem precisasse. A ajuda não se restringia apenas a pessoas de Imperatriz, sua ação social tinha um alcance regional.

Em um momento da conversa, o professor Ronaldo compartilhou uma história pessoal que envolveu a pomada de Frazão, demonstrando a eficácia do produto. "Eu tinha um vizinho diabético que tinha um ferimento no dedo grande do pé, que já estava há mais de um ano e não cicatrizava. Ele fazia curativos regulares, mas o ferimento não sarava", contou Ronaldo. Foi então que a irmã do vizinho falou sobre a pomada de Frazão, e o professor pediu para ele levar o remédio. "Meu vizinho começou a usar a pomada e, em menos de um mês, estava curado!", afirmou Ronaldo, com entusiasmo.

Outra amiga do professor, Ivaneide Oliveira Nascimento, engenheira agrônoma e educadora com habilitação em biologia, informou que, durante sua trajetória acadêmica, teve a oportunidade de conhecer  Frazão.  A amiga da família lembra-se do início de sua jornada na UEMA, quando conheceu o docente. "Eu entrei na instituição em 1996, como seletiva, e foi nessa época que conheci o professor Frazão. Embora eu não tenha participado diretamente dos trabalhos dele, eu acompanhava suas pesquisas", revela Ivaneide.

Frazão, que sempre foi apaixonado pelos estudos envolvendo plantas medicinais, iniciou seus trabalhos na universidade antes de estabelecer um laboratório na Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), em Imperatriz, onde passaria a realizar a extração de óleos e a elaboração de pomadas.

Ivaneide compartilha sua memória sobre essa iniciativa de doação para os internos na Vila João XXIII. "Ele fazia a extração de óleo, produzia pomadas e levava para a vila perto do IFMA [Instituto Federal do Maranhão], onde moravam pessoas com hanseníase. Ele tratava as feridas desses pacientes com essa pomada", conta a professora, ressaltando a importância social do trabalho de Frazão.

Embora o professor Frazão tivesse uma grande dedicação à pesquisa, ele não formalizava seus projetos em parceria com instituições ou programas de iniciação científica. "Os projetos dele eram mais autônomos. Não havia vínculo com o PIBID [Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência] ou qualquer financiamento institucional. Eram iniciativas voluntárias, feitas com a participação de alguns alunos, mas sem bolsas de pesquisa", detalha Ivaneide.

Na Vila João XXIII, seu nome ficou marcado na memória de muitos. Conhecido pelo seu espírito generoso, Frazão não apenas visitava a comunidade, mas também ajudava os moradores com o remédio caseiro, a pomada de graviola. A história, que começou nos primeiros anos de 2000, se transformou em uma verdadeira corrente de esperança para os pacientes da vila, especialmente aqueles que lutavam contra feridas e cicatrizações difíceis.
 

Francisco dos Reis, técnico de enfermagem da vila, compartilha que Frazão fazia visitas regulares à comunidade, geralmente aos sábados, levando seus potes de pomada, de aproximadamente 500ml, toda semana. Durante seis a oito meses, o professor tornou-se uma figura constante, conhecida não apenas pela sua generosidade, mas também pelo carinho com os pacientes.

“Ajudava muito na cicatrização das feridas. A pomada foi muito bem aproveitada. Os pacientes gostaram bastante da ajuda, e a experiência foi muito positiva para todos nós na época", conta Francisco. A pomada de graviola se tornou um alívio para muitos que enfrentavam ferimentos difíceis de curar, com resultados visíveis de melhora e bem-estar.

A eficácia do remédio era inegável. Francisco lembra que, enquanto o professor Frazão continuava levando a pomada caseira, muitas pessoas se sentiam mais confiantes em relação à recuperação de suas feridas. “Era uma pomada caseira, natural, e funcionava muito melhor do que outras que encontrávamos nas farmácias. A sulfadiazina de prata, que é usada atualmente, nunca trouxe os mesmos resultados", compara Francisco.

Para o técnico de enfermagem, Frazão era sempre bem-vindo na Vila João XXIII. “Era um amor de pessoa. Não só levava medicação, mas se preocupava genuinamente com os pacientes”, recorda Francisco. A tristeza de ver Frazão se afastar deixou uma marca na comunidade, que sentia falta não apenas das pomadas, mas também da presença calorosa de quem, por tanto tempo, trouxe esperança.

Após a repercussão da ajuda de Frazão na comunidade, o nome dele foi parar em um quadro considerado depreciativo do Fantástico, o que trouxe uma mudança significativa, como pode ser conferido no capítulo 5 desta reportagem. Depois de ser identificado como químico e não como médico, ele foi proibido de continuar fabricando e distribuindo a pomada. Isso causou um impacto grande na vila, pois a ajuda do professor já havia se tornado parte da rotina de muitos.

Ivaneide também complementa sobre essa fase difícil.  "Infelizmente, as pesquisas dele não deram continuidade. Como ele não tinha alunos bolsistas nem financiamento, os projetos não foram formalizados, e não houve recursos para dar continuidade".

Sabe-se que, por muito tempo, o professor Frazão desenvolveu seus estudos em um laboratório no aeroporto de Imperatriz, com autorização da Infraero. No entanto, após a reportagem exibida pelo programa Fantástico, a instituição fechou o espaço, forçando Frazão a continuar suas pesquisas e a produção de pomadas em sua própria casa. "Assim, ele montou um laboratório em casa e seguiu com seu trabalho", relata Ana Paula. Com o falecimento do professor, em abril de 2021, sua família decidiu doar todo o material do laboratório à Uemasul, incluindo equipamentos e vidrarias.

REPORTAGEM

Tayná Duarte


DIAGRAMAÇÃO E MONTAGEM

Tayná Duarte e Rubem Rodrigues


IMAGENS

Arquivo Pessoal, Daniel Sena, Edmara Silva, Fernando Cunha,

TV Difusora (afiliada do SBT) e Globoplay

ESTE TRABALHO FOI ELABORADO COMO PARTE DA CONCLUSÃO DO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO EM JORNALISMO DO CENTRO DE CIÊNCIAS DE IMPERATRIZ (CCIM), SOB A ORIENTAÇÃO DO PROF. DR. ALEXANDRE MACIEL.

12 de fevereiro de 2025

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